Os Lanceiros Negros na Revolução Farroupilha: Um Legado de Coragem e Lealdade

Os Lanceiros Negros na Revolução Farroupilha: Um Legado de Coragem e Lealdade

Por Guilherme Fernández

A Revolução Farroupilha, que teve lugar entre 1835 e 1845, figura como um dos acontecimentos mais emblemáticos na história do Rio Grande do Sul e viu surgir diversos protagonistas notáveis. Entre esses, os Lanceiros Negros destacam-se como uma força revolucionária de vital importância na batalha pelo ideal republicano e pela autonomia da província. Constituídos por emancipados e negros alforriados, os Lanceiros Negros exibiram destemor, lealdade e resolução, fornecendo uma contribuição inestimável à causa farroupilha.

A participação dos Lanceiros Negros na Revolução Farroupilha encarna a diversidade étnica e o comprometimento conjunto a um ideal compartilhado de justiça e liberdade. Muitos desses indivíduos, outrora submetidos à ignomínia da escravidão, perceberam na revolução uma oportunidade para conquistar não apenas a sua própria liberdade, mas também a dos seus pares. Enfrentando as agruras da guerra, demonstraram habilidade e bravura singular no teatro de operações, atestando que a luta pela liberdade transcende distinções raciais.

É de vital importância assinalar que a Revolução Farroupilha não se inscreveria na história da mesma forma sem a contribuição dos Lanceiros Negros. Estes figuraram de modo preponderante na defesa das posições farroupilhas, desempenhando papel de destaque na Batalha de Porongos, um episódio infelizmente obscurecido por polêmicas e versões distorcidas.

Refutando a Narrativa Falsa sobre a Batalha de Porongos:

Persiste uma narrativa equívoca que imputa ao General David José Martins, conhecido como David Canabarro, a traição aos Lanceiros Negros durante a Batalha de Porongos, urdida por Chico Mouringue (ou Chico Diabo) e Luís Alves de Lima e Silva, o Barão de Caxias. Esta versão dos eventos encontra-se, contudo, amplamente desacreditada por escassos historiadores de boa-fé que empenharam-se em desvelar os fatos ocultados pela historiografia brasileira. Não subsistem provas sólidas que confirmem a suposta conspiração do General David Canabarro com Chico Mouringue e o Barão de Caxias.

A Batalha de Porongos representou um conflito exacerbadamente intrincado e tenso, travado entre as forças farroupilhas e o Império Brasileiro. O Corpo de Lanceiros, em sua maioria composto por negros, mas também integrado por indígenas, mestiços e brancos, encontrava-se posicionado entre as duas facções, e a imputação de traição ao General Canabarro baseia-se, predominantemente, em conjecturas e relatos não corroborados.

É imperativo reconhecer a relevância do Corpo de Lanceiros sem perpetuar narrativas infundadas de traição, especialmente os negros que sempre combateram valorosamente e, por vezes, preferiram enfrentar a morte no campo de batalha em vez de retornar à condição de escravidão sob os auspícios dos barões monarquistas. Combatentes tão destemidos que surpreenderam e conquistaram até mesmo a admiração do herói de dois mundos, e o próprio fez uma observação memorável: “Eu testemunhei confrontos de envergadura, mas em nenhum lugar e ocasião encontrei homens mais corajosos nem lanceiros mais destemidos do que aqueles que compunham a cavalaria rio-grandense, na qual comecei a desdenhar o perigo e a lutar pela causa sagrada dos povos. Quantas vezes me vi tentado a divulgar perante o mundo os feitos assombrosos realizados por esse povo viril e intrépido, que sustentou uma encarniçada e gloriosa luta por mais de nove anos contra um império poderoso!” É talvez ao General Giuseppe Garibaldi, no Museu de Bolonha, Itália, que se deve o quadro intitulado “Farroupilha”, imortalizando um lanceiro negro da República Rio-Grandense. Estes merecem ser recordados como os pioneiros heróicos na luta pela liberdade e igualdade, que contribuíram de modo significativo para a história do Rio Grande do Sul. A sua bravura e lealdade na batalha pela autonomia e justiça devem servir como um exemplo de resiliência e determinação para as gerações vindouras.

Guilherme Fernandes

Guilherme Fernandes

índio gaúcho e vice-presidente da Resistência Sulista

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