Taiwan nunca foi um Estado secessionista

Por Guilherme Fernandes
Nos últimos meses tem se visto falar muito no conflito entre os dois Estado chineses que vivem uma disputa antiga desde a libertação da China do jugo da dinastia Quing, um momento decisivo, que os nacionalistas do Kuomintangs e os comunistas lado a lado inauguraram uma nova era na China ao proclamarem a República chinesa.
Depois de consolidada a República e o novo Estado na China, com a derrocada da monarquia, coube aos nacionalistas e comunistas, outrora aliados, disputarem o domínio da liderança da China. Assim inicia-se a Guerra Civil Chinesa 1927–1937; 1946–1949. De um lado do governo os comunistas consideravam que a instauração da República, em 1911, e a chegada ao poder do Partido Nacionalista não resultaram em um Estado efetivamente soberano nem proporcionaram reformas sociais profundas que melhorassem a vida dos trabalhadores urbanos e rurais chineses.
Desde então, a China viveu períodos alternados de guerra civil entre nacionalistas e comunistas e períodos de aliança, nos quais esses dois grupos lutaram juntos contra agressões estrangeiras — como a invasão japonesa na década de 1930 e no decorrer da Segunda Guerra Mundial. O fim da Segunda Guerra e a expulsão das forças japonesas do território chinês abriram um novo período de acirrada disputa de poder entre os nacionalistas e os comunistas.
O líder dos nacionalistas, Chiang Kai-shek, não resistiu ao avanço dos guerrilheiros camponeses comandados pelo líder comunista Mao Tsé-tung. Em 1º de outubro de 1949, Mao chegou ao poder na República e instaurou o atual Estado da China continental mais conhecida como “República Popular da China” e reorganizou o país nos moldes comunistas, com a coletivização das terras e a expropriação das grandes empresas, que passaram para o controle estatal.
Chiang Kai-shek e os nacionalistas refugiaram-se na Ilha de Taiwan (Formosa) e fundou o segundo Estado da China, que carrega até hoje o nome oficial do país desde o fim da guerra contra a dinastia Quing, tal como “República da China”. Ainda hoje, mesmo com um grupo minoritário intitulado de “verdes” no poder atualmente, Taiwan se auto-intitula a “verdadeira China”, mas é considerada como uma “província rebelde” pelo governo continental.
Quando a Organização das Nações Unidas (ONU) foi criada, em 1945, a China sob a liderança dos Kuomintangs foi um de seus membros fundadores, e após o fim da guerra civil, em 1949,com os nacionalistas já refugiados em Taiwan, ainda eram eles quem ocupava o assento chines na ONU representando toda a China.
Essa situação durou até 1971, quando a China continental ingressou na ONU, forçando o Estado chines de Taiwan a deixar a instituição. Desde então, o poder político e econômico da China Popular se impõe, obrigando todos os países com quem mantém relações diplomáticas a cortarem os laços oficiais com Taiwan.
Mas esse isolamento político, não significou isolamento econômico. Não impediu o desenvolvimento da Ilha. Taiwan possui uma economia dinâmica e se tornou um dos principais exportadores da Ásia, mantendo relações comerciais com todo o mundo e participando de blocos econômicos regionais. Sem nunca deixar de se apresentar como a “verdadeira China”.
Na prática, Taiwan tem todas as condições que a definem como um país: Um governo próprio eleito democraticamente, instituições sólidas, uma moeda nacional, forças armadas e um território delimitado. Mas mesmo assim nunca se viram como sendo a parte da China continental. A grande maioria dos chineses da ilha, sempre desejaram a reunificação, pois mesmo o lugar adquirindo um ethos próprio, estão inseridos no mesmo dasein chines. Nunca deixaram de serem e de se verem como chineses.
O Gabinete de Assuntos de Taiwan do Conselho de Estado e o Gabinete de Informação do Conselho de Estado da China publicaram um ‘white paper’ no dia 10/08/2022 intitulado “A questão de Taiwan e a reunificação da China na nova era”. O documento foi divulgado após as tensões desencadeadas pela visita provocativa da presidenta da Câmara dos EUA, Nancy Pelosi, ao território insular na semana passada.
Um ‘white paper’ é um relatório que consolida informações de forma concisa. O que foi divulgado pelo governo chinês demonstra a determinação do Partido Comunista da China (PCCh) e do povo chinês com o compromisso com a reunificação nacional.
O documento foi publicado na esteira da escalada das tensões no Estreito de Taiwan e dos exercícios militares do Exército de Libertação Popular (ELP) contra os separatistas e a interferência estrangeira. Serve de alerta para as autoridades de Taiwan e para as forças externas e mostra que a China continental é forte para resolver a questão no novo cenário.
“Somos uma China, e Taiwan é parte da China. Este é um fato indiscutível apoiado pela história e pela lei. Taiwan nunca foi um estado; seu status como parte da China é inalterável”, declara o relatório, que também observa que o PCCh está comprometido com a missão histórica de resolver a questão do território insular e realizar a reunificação completa da China.
“A realização da reunificação nacional completa é impulsionada pela história e cultura da nação chinesa e determinada pelo impulso e circunstâncias que cercam nosso rejuvenescimento nacional”, assegura o ‘white paper’.
“Nunca estivemos tão perto, confiantes e capazes de alcançar o objetivo do rejuvenescimento nacional. O mesmo acontece quando se trata do nosso objetivo de reunificação nacional completa”, acrescentou.
O documento é o terceiro ‘white paper’ da China sobre a questão de Taiwan. As edições anteriores foram “A questão de Taiwan e a Reunificação da China”, “The Taiwan Question and Reunification of China”, de 1993; e “O princípio Uma só China e a Questão de Taiwan”, de 2000.
Como nas edições anteriores, o terceiro relatório sobre o tema mais uma vez enfatizou que a reunificação pacífica e “um país, dois sistemas” são os princípios básicos da China para resolver a questão de Taiwan e a melhor abordagem para realizar a reunificação nacional. O documento ressalta que as diferenças no sistema social no continente e em Taiwan “não são um obstáculo à reunificação nem uma justificativa para o secessionismo”.